
Decisões judiciais não são para se gostar, ou não...
Publicação em 23.03.21Imagem Camera Press

Salomão foi o terceiro rei de Israel, governando durante 40 anos (966 a 926 a.C.). Nasceu e morreu em Jerusalém (990 a.C. > 921 a.C.)
PONTO UM:
Nos últimos dias, ondas de indignação e também de apoio circularam pelo Estado por conta de uma decisão judicial oriunda de uma ação civil pública envolvendo a gestão da pandemia em uma das Varas da Fazenda Pública de Porto Alegre. Decisão judicial, queiram ou não, não é para se gostar ou não gostar. Decisão judicial ou é acolhida pelas partes no processo ou submetida a recurso com vistas à sua reforma junto às instâncias recursais.
O grande público – que do processo não participa, mas que até pode sofrer reflexos desta decisão – pode democraticamente se manifestar opinião sobre ela. Mas é tão somente opinião - e não tem qualquer poder de interferência sobre a decisão. Simples assim. O sistema judicial, reduzido a essa essência – decidir um conflito –, funciona desta forma há mais de dois milênios e em todos os cantos do mundo: um perde, outro ganha.
Não há milagres. Decisão judicial não há que se qualificar por ser certa ou errada: entre as teses antagônicas discutidas no processo, cumpre ao julgador acolher uma e rejeitar outra, desde que de forma fundamentada. Sempre foi assim e continuará sendo, ainda que em tempos de judicialização da política – o que não foi provocado pelo Poder Judiciário – certas decisões ganham repercussões imensuráveis, mas faz parte do jogo.
PONTO DOIS:
Escrevendo esta coluna, lembrei-me da conhecida passagem bíblica em que Salomão – como juiz supremo – decide cortar ao meio a criança sobrevivente e disputada pelas duas mães, para que cada uma recebesse a metade, pondo fim ao conflito.
Esta passagem não reproduz um sistema judicial, que certamente não sobreviria com soluções tais. Transmite muito mais uma lição de amor: a verdadeira mãe é aquela que abre mão do filho para que o mesmo não seja sacrificado em razão de uma contenda.
Nem o DNA seria tão eficiente. Porém, não é dado ao juiz, no sistema judicial, partir ao meio o bem da vida postulado (abre o comércio na segunda, e fecha na terça). Em sede de decisão há que partir-se, violar-se, valendo-se da Constituição, da lei, dos princípios.
Não é diferente quando o grau recursal é chamado a intervir: também os órgãos superiores seguirão o mesmo caminho, optando por uma das duas versões apresentadas. Agora, o que é inadmissível, antissocial, antidemocrático é voltar-se contra a pessoa, nome, honra, família do julgador porque decidiu desta ou daquela forma: este comportamento tribal não condiz com uma sociedade civilizada.