Os tristes casos do juiz assediador em série
Publicação em 17.11.23
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Em 16 de outubro último, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), por meio de dois discretos registros no Diário da Justiça - com o uso apenas das iniciais dos seus respectivos nomes - afastou dois magistrados de suas funções. Eram eles: Angélica Chamon Layoun (da comarca de Cachoeira do Sul), por insatisfatória produção jurisdicional; e Odijan Paulo Gonçalves Ortiz (da comarca de Vacaria). Contra este segundo, logo ficou-se sabendo da existência de representações a propósito de reiteradas importunações sexuais praticadas, em diferentes momentos, contra quatro mulheres, individual e separadamente.
Ontem (16) - um mês depois da oficial publicação punitiva - o TJRS admitiu a existência de sólidos indícios e contundentes depoimentos das vítimas, assim solidificando o afastamento de Odijan Paulo: ele assediou uma própria colega magistrada, uma advogada e duas estagiárias.
Dois processos administrativos disciplinares correm em sigilo no TJ-RS e no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) desde maio deste ano, quando a primeira denúncia chegou na Corregedoria gaúcha.
As investidas inaceitáveis de Odijan ocorriam no ambiente de trabalho, em espaços públicos e também nas redes sociais. O assediador havia ingressado na magistratura, via concurso público, em setembro de 2022. Oito meses depois - já detectado o seu perfil - ele foi transferido para a Comarca de Vacaria, onde atuou durante cinco meses, até ser afastado preventivamente (com direito a continuar recebendo seu salário).
Ele ainda está no período chamado de vitaliciamento, que equivale ao estágio probatório para magistrados. Assim, Odijan pode ser exonerado se o procedimento administrativo disciplinar for julgado procedente. No caso, ele perderá o direito à remuneração.
Em hipotéticas ocorrências semelhantes, em que se envolva um magistrado vitaliciado, a “pena máxima” - branda - é a de aposentadoria com vencimentos proporcionais.
Em julho último, a Corregedoria-Geral da Justiça concluiu um procedimento administrativo de que participaram 15 juízes corregedores. Nos autos digitalizados estão os depoimentos das quatro mulheres que confirmam terem sido importunadas pelo magistrado. Também é este expediente que sustenta o procedimento aberto no Conselho Nacional de Justiça.
O caso também foi encaminhado ao Ministério Público Estadual, que já está apurando se a conduta do magistrado tem tipificação penal. O procedimento está na fase de coleta de provas e depoimentos. No encerramento, haverá o arquivamento, ou a denúncia criminal.
Ocorrendo esta, a capitulação será feita no art. 215-A, da Lei nº 13.718/2018, que alterou alguns dispositivos do Código Penal Brasileiro. O texto legal atualizado trata da importunação sexual e tipifica como crime “praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro”.
A pena é de reclusão, de 1 a 5 anos - se o ato não constituir crime mais grave.
O Espaço Vital não divulga o nome da comarca onde ocorreram os assédios para evitar dissabores em relação às pessoas das quatro mulheres que foram assediadas e que confirmaram detalhes sobre o modo de agir do magistrado.
A propósito: Judiciário machista
Única mulher na atual composição do STF, a ministra Cármen Lúcia criticou na terça (14), durante seminário organizado pelo jornal O Estado de S. Paulo, a falta de igualdade no sistema de Justiça. E afirmou que até ela, como magistrada, sofre preconceitos.
Duas frases dela: “O Judiciário continua muito preconceituoso em relação às mulheres; machista, também. Quando se faz concurso público para a magistratura, nós temos acesso porque passamos nas provas, mas nas promoções nós não temos as mesmas condições”.